Friday, August 31, 2007

Rosa Pasmada - Gilda de M. e Souza - Parte 2



Roberto ouviu os passos leves morrerem no tapete da sala e por um momento se arrependeu. Não lhe teria custado nada ter estendido mais francamente a mão, ter revelado por um movimento, que recebera o beijo amigo. Mas todas essas eram concessões perigosas, contrárias à linha de conduta que se vinha traçando. Tinha horror de que um gesto mais terno seu tornasse a despertar em Lúcia a antiga sofreguidão e que, como um cão humilde que recebe um carinho, ela se pusesse a rondar à sua volta. E era bastante recente a experiência que tivera, de sua impotência em se desvencilhar desses agrados, para que um remorso passageiro o fizesse voltar atrás, quando já ia a caminho de reconquistar a própria vida. Além do mais, não era preciso se inquietar muito, porque a incapacidade que a mulher tinha de aturar a solidão, logo a traria de volta. Agora ficaria por algum tempo vagando pela casa, desguaritada, lutando contra as lágrimas, tão fáceis de rolar. Procuraria se distrair com alguma coisa, talvez fosse fechar as janelas por causa da chuva que vinha, ou examinar a porta da copa que as criadas nunca trancavam direito. Mas depois voltaria com passos mansos de ladrão. E, enrolada num canto, havia de ficar olhando para ele, em silêncio.
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